Artes Plásticas: o “destino” de Jarina.

Apesar da pouca idade, ainda no distante Massapê, Jarina precisou se fazer ao mar. Empurrada pela perda da mãe, Carlinda, quando contava somente dezessete anos, ela viu-se obrigada a cuidar dos dois irmãos caçulas: um de 9 anos e o outro com apenas 5 anos de idade. Juntando esforços com a irmã, ela alimentou, zelou pela saúde e semeou educação nos dois irmãos órfãos.
É bem verdade que naquele distante e conservador Ceará, não restava a Jarina muitas alternativas. Daí o casamento precoce, ainda no mesmo ano da morte da mãe.
Nesse período, Jarina também se envolveu com a política, filiando-se à Liga das Mulheres do Partido Comunista Brasileiro…

 

Mulher 3

Artes Plásticas: as nuvens do velho e querido Ceará na arte de Jarina Menezes.

É interessante perceber a trajetória das pessoas. Porquanto, muitas vezes, ela revela os potenciais latentes em cada um de nós. Vejam, por exemplo, o caso de minha querida mãe, Jarina Menezes. Nascida em Massapê, no velho Ceará, desde muito cedo Jarina se punha a observar as nuvens brancas dançando no céu azul do agreste, formando estranhas figuras no seu imaginário. Por certo ela não intuía, mas, quem sabe não nascia ali o universo surrealista que acompanharia para sempre a sua extraordinária arte?

Se foi isso, então, resta-nos agradecer às nuvens e a fértil imaginação daquela menina que “brincava com a imaginação”…

Mulher 2

Artes Plásticas: o surrealismo de Jarina Menezes.

Esta semana eu gostaria de prestar uma homenagem a uma criatura muito especial em minha vida: minha mãe, Jarina Menezes.

Ela foi uma extraordinária artista plástica. Surrealista. Amante de Miró e Picasso, Jarina deixou um belíssimo legado de amor e de arte.

A série que apresentarei aqui se intitula “Mulheres sem rosto”. Nela, minha mãe reverenciou as tantas mulheres que lutam pelo respeito e consideração de todos. Mulheres que podem ser bailarinas, rendeiras ou o que o destino permitir que sejam. Afinal, na arte ou na vida, o importante é que consigam passar adiante o imenso amor que há dentro delas. Amor aos seus filhos, como fez Jarina. Amor ao mundo, como fazem todas as mulheres… Abençoadas sejam!

 

Mulher 1

Memórias: ” Pôr do sol” no Rio Paraíba, em João Pessoa – Paraíba.

Pôr do sol na Praia Fluvial do Jacaré, no Rio Paraíba, em João Pessoa. Um lugar inteiramente mágico, que parece estar fora desse mundo…
O mais interessante de tudo, minha gente, é que todos os dias aparece, em um barco, o músico Jurandy do Sax. Com extrema elegância, ele vem coroar o pôr do sol tocando o Bolero de Ravel. Por conta disso, uma multidão fica aguardando a sua chegada. Afinal, ele tornou-se celebridade e referência!!

Rio Paraíba

Disco: “All of me”, de John Pizzarelli.

Outro dia eu estava com o meu amigo Gérson Lepletier na simpática Biblioteca de Arte e Cultura, no Centro Integrado de Cultura, de Florianópolis, quando me ocorreu a lembrança sobre os novos valores do jazz. E como eu sei que ele é um profundo conhecedor de vocalistas, fui logo dizendo: “Gérson, estou impressionado com o talento do cantor e guitarrista, John Pizzarelli. O som que ele produz na guitarra é primoroso. A voz, no entanto… bem… acho que é apenas razoável. Muito embora haja carência de graves, consegue dar o recado. Em algumas passagens, ele até me faz lembrar o início da carreira de Chet Baker. Agora, convenhamos, o bom gosto na escolha do repertório, este sim, é o que há de melhor nele”.
Pizzarelli, muito à vontade, passeia nos principais “hits” do cancioneiro americano, abusando do refinamento nos solos da guitarra. A voz melosa, bem ao estilo dos “crooners” de boate, consegue captar a atmosfera intimista dos consagrados “blues”. Olha, verdade seja dita: o jeitão dele cantar “If I had you” tocou a minha alma. Coisa linda! Isto, sem falar da belíssima interpretação em “My baby just cares for me”, que ficou impecável, meus amigos. Além disso, Pizzarelli é apaixonado pela nossa imortal “bossa-nova”. Tanto é verdade que ele convidou Daniel Jobim (neto do eterno Tom Jobim) para uma apresentação especial de 75 minutos no XX Festival de Jazz de San Javier, Espanha, em julho de 2017. Maravilha!
Por certo, já ouvimos algumas criaturas afirmando que o jazz morreu. No fundo, podem acreditar: é puro engano! Até porque, Pizzarelli está aí para desmentir essa gente… Ah, como é bom saber que o nosso jazz se renova. Sempre e sempre!

Família: “João Pedro e os tomates”.

Cada um come o tomate do jeito que mais gosta, não é verdade? O meu neto João Pedro, por exemplo, está descobrindo o jeitinho dele… um pouco diferente, talvez… Mas, que é lindinho, lá, isso é! Uma maravilha!

Celebração: “Mercado Público de Florianópolis”.

Florianópolis está realmente de parabéns! Em novembro de 2017, eu fui ao Mercado Público de Florianópolis na hora do almoço. Ontem, eu repeti a dose. E novamente o que se contemplava era uma grande festa…  Confesso que há muito tempo eu não via tanta gente feliz, meus amigos. Gente celebrando o feriadão. Gente celebrando os amigos. Tudo era motivo de interação entre as pessoas presentes e a banda de rock que contagiava a todos.
De fato, havia ali uma multidão ávida por cantar, sacudir a poeira e dar a volta por cima… Coisa linda!

Disco: ” Fine and Dandy”, com Stephane Grappelli.

Meus amigos, convenhamos, ele é a carinha mais simpática do mundo do jazz! E no meu imaginário, confesso: sempre sonhei com um “avô” assim… Meu Deus, como esse “endiabrado” velhinho tocava bem! Seu violino mais parecia o prolongamento do coração, que certamente não cabia no peito. Basta ouvir Stephane Grappelli tocar “Over the rainbow” e, imediatamente, sinto-me como uma criança em o “Mágico de Oz”: siderado! Sua música é tão mágica quanto o filme. Pura fantasia. Coisa linda!
O disco “Fine and Dandy” é mais uma dessas “adaptações brasileiras”, cujo objetivo é faturar em cima do nome do artista. Paguei apenas “cinco pratas” pelo meu, vejam vocês… No entanto, chego a acreditar que o nosso querido Grappelli ficaria feliz com a notícia, pois sempre foi irreverente e despojado!
Ouçam “I can´t get started” ou “Nature boy” e sentirão os acordes mais “soltos” que o violino consegue aceitar, sem queixas. Pudera! Grappelli desliza pelas cordas como se acariciasse o corpo da mulher amada…
Ah, eu sinto tantas saudades do som daquele violino, da leveza com que “passeava” pelas músicas… Por isso, envio um saudoso beijo ao meu querido e “adotado vovô Grappelli”. Sua bênção, vô!

Stephane

Disco: “The Essential”, com Billie Holiday.

O que se pode dizer a respeito de Billie Holiday? Céus… creio que quase tudo já foi dito. De imediato, é verdade, devemos reconhecer que ela é foi grande dama do “blues” e a voz mais “lamentosa” que ouvi nesta vida… Confesso a vocês: que a minha esposa não saiba, mas ninguém sussurrará nos meus ouvidos como Billie! Se você, amigo leitor, ainda não teve a felicidade de ouvir Billie Holiday cantar “Sophisticated Lady”, então, a sua vida está incompleta. Nada teve sentido e os seus olhos ainda não brilharam… O que é uma lástima!

O título deste CD não poderia ser melhor: “Songs of lost Love”. Portanto, não me culpe pela “dor de cotovelo” que se apossará de você ao ouvir o disco. É da vida, mano… Fazer o quê?!

Por conta disso, a minha sugestão é de que você faça como ela. Suplique: “Lover, come back to me”. Talvez você tenha mais sorte e quem sabe o seu sonho possa, enfim, acontecer?!

Para completar a seleção de craques do time, temos Oscar Peterson, Benny Carter, Ray Brown, Barney Kessel e Ben Webster. Formam as feras que acompanham a nossa Billie no disco. Céus… é brincadeira, bicho!

A remasterização feita nas gravações de 1952 a 1957 ficou impecável. Então, por tudo isso, tornou-se um disco antológico. “Love me or leave me”, entoava Billie com sofreguidão… Depois disso, quem terá coragem de deixar a nossa “deusa”?!

https://www.youtube.com/watch?v=hHksWjoGs0I

https://www.youtube.com/watch?v=–9aIYos4M8

Billie

Cinema: filme “Malena”, de Giuseppe Tornatore.

OS  “ESCONDERIJOS”  DA  MEMÓRIA.

Vejam como são as coisas: eu precisei esperar mais de três décadas para me dar conta de um terrível engano que cometi. E digo mais, meus amigos: tomara que eu tenha me redimido, pois só assim terei feito as pazes com o meu coração. Afinal, como dizia o poeta Fernando Pessoa: tudo vale a pena se alma não é pequena. Dito isso, peço que me deixem relatar os fatos. É que, no fundo, eu acredito que vocês me compreenderão, já que têm sido testemunhas e parceiros nas minhas “expiações”.

Na verdade, tudo começou quando assisti ao belíssimo filme Malena. Meus amigos, que filme encantador! Foi construído pelo mestre Giuseppe Tornatore, o mesmo diretor do antológico Cinema Paradiso. Ah, somente pelas mãos desse “artesão” poderíamos receber tal presente: uma viagem no imaginário da adolescência. Olha, confesso a vocês, eu mal consigo me conter, uma vez que são muitas as lembranças daquela época.

Para início de conversa, o “pecado” tinha um nome: chamava-se Isabel. Sem dúvida alguma, ela foi a mais linda morena que os meus olhos contemplaram. Mas, para mim, ela sempre se chamou Belinha. Céus, onde estará aquela menina? Que rumo terá seguido na vida? Terá sido feliz? Meu Deus, eu daria tudo para ter notícias dela. Quem sabe poder trocar uma prosa, um sorriso ou um simples olhar? Saber se os seus sonhos se realizaram, se a vida foi generosa com ela… essas coisas que o “destino” apronta!

O certo é que Belinha marcou para sempre a minha memória-afetiva, deixando um especial registro em meu coração. Por ironia, quis o destino que esse amor fosse interrompido pelos meus medos. Ah! Foi uma grande pena, isso sim, porquanto eu era jovem demais para saber lidar com os sonhos. E os sonhos, minha gente, também podem nos assustar. Lamentavelmente. Algumas vezes, reconheçamos, eles são capazes de nos acuar e promover profundas transformações nos caminhos da gente. Dessa forma, eles acabam selando a sorte de quem os viveu.

Hoje, eu reconheço: fui erroneamente “bem-comportado”. Talvez devesse me rebelar, romper com o mundo e queimar meus navios… No entanto, não lutei pelo afeto. Simplesmente aceitei o destino como se fosse uma sina. Sendo assim, acabei paralisado diante dos medos. E o que se sabe é que os medos são implacáveis com quem os sente. Sem remorsos ou piedade, os medos arrefecem os sonhos e tomam a desavisada criatura como refém, fazendo dela mais uma vítima. Com profundo lamento, eu declaro: foi o que me ocorreu.

É bem verdade que eu tinha apenas 15 anos e ainda era uma criança cheia de esperanças na vida. Na escola, eu frequentava o grêmio estudantil e me iniciava na luta contra a opressão do regime, a ditadura. Eram tempos difíceis! Havia muito “medo” pairando no ar. Em cada esquina, um desafio. Em cada empreitada, um temor. E dessa forma, nós seguíamos firmes junto à “causa”, tentando tornar o mundo mais justo e humano. Procurando abrir espaços para os jovens que, como eu, acreditavam nos ideais “socialistas”. Apesar dos inúmeros fantasmas que nos rondavam, aquele período foi muito rico em vivências. Lá, isso foi!

Naquela época, lembro bem, os militares mandavam e desmandavam nos destinos do país. Reiteradas atrocidades foram cometidas em nome da “ordem e do progresso”, lema equivocadamente furtado de nossa bandeira. Existia até um chavão: “Brasil, ame-o ou deixe-o!”. E se por acaso o nosso “amor” não era bem aquele que eles desejavam, então, éramos “convidados” a “deixar” o país. Muitas vezes, para sempre! Perdi diversos amigos. Alguns deles, verdade seja dita, eram somente estudantes “ingênuos” que nunca entraram no movimento, quer por medo, quer por cinismo ou mesmo divergência. Outros, caíram na clandestinidade e alguns foram até para a luta armada.

Desafortunadamente, o pai de Belinha era um general do exército, da chamada “linha dura”. Todas as vezes que o via, eu tremia dos pés à cabeça. E ele, como que adivinhando, olhava-me sempre com suspeição ou “rancor”. Certa vez, o general nos flagrou namorando nas escadas do prédio. Nossa! Nunca desci tão rápido uma escada na vida. Eu parecia até um atleta correndo 100 metros com barreira… Que sufoco!

Foi quando eu resolvi me afastar de Belinha, uma vez que me sentia “perseguido” pelo pai (ou, quem sabe, pelos temores que ele me desencadeava?). Contudo, foi o meu maior engano. Isto porque, um amor feito aquele não se acha duas vezes na vida, meus amigos. Seguramente.

Bem, aí o tempo foi passando e eu cada vez mais engajado no movimento estudantil. As manifestações de rua tomavam a cidade por todos os lados. Ora ocorria uma passeata de protesto na Praça Cinelândia, ora um comício-relâmpago no restaurante universitário. Como sempre, havia muita tensão e nervosismo no ar. E nos breves encontros, aproveitávamos para obter informações sobre os companheiros “desaparecidos”.

Até que um dia, sem nenhum aviso, Belinha mudou-se de bairro. E eu nunca mais tive notícias dela, apesar das incessantes buscas que empreendi. Num átimo, Belinha virou “passado”. Sofri muito, é verdade. Chorei por sua ausência durante bastante tempo e me culpei pela falta de coragem. Meu Deus, por que foi mais fácil lutar por uma causa do que por um afeto?! Por que sempre é mais fácil morrer por uma ideologia do que viver por um grande amor? Por quê?!

É, minha gente, por aí vocês podem avaliar como demorei a “reencontrar” os meus afetos. Perversamente, eles se extraviaram naquele dia em que abdiquei o amor de Belinha. E o mundo teve que girar um bocado para que eu pudesse ter de volta os meus afetos perdidos. Para tanto, precisei encontrar maravilhosas criaturas no percurso. E elas, ao me ofertarem abraços, foram responsáveis por essa recuperação. De alguma forma, esta crônica é dedicada a todas as pessoas que me estenderam a mão.

Também é verdade que precisei me comover com as belas histórias dos livros e filmes. Porquanto são capazes de revelar os sentimentos dos homens, restaurando os nossos pedaços. Felizmente, não faltaram talentos a nos brindar com extraordinárias obras. É bem o caso de Giuseppe Tornatore. Ele já nos deu o Cinema Paradiso, Estamos todos bem, Uma pura formalidade, A lenda do pianista do mar e, dessa vez, Malena.

A história de Malena nos remete ao Cinema Paradiso, uma vez que percebemos o mesmo tema e o desejo de fazer “expiações”. Tornatore retorna às antigas vilas da Itália. E se em Cinema Paradiso a vila Giancaldo foi o palco onde brilhou o menino “Totó”, em Castelcuto temos “Renato Amoroso” conhecendo as manhas da paixão. Ambos foram acolhidos com magníficas histórias, impecáveis fotografias e a soberba trilha sonora de Ennio Morricone.

A iniciação amorosa do menino Renato se dá em meio a Segunda Grande Guerra. Ao conhecer Malena, a belíssima musa de seus sonhos juvenis, Renato descobre bem mais do que o desejo ou a paixão: descobre a fidelidade. Por Malena, Renato foi capaz de conhecer o seu próprio corpo e aprendeu a respeitá-lo. E, precocemente, ele teve que desenvolver o sentido ético nas relações interpessoais. Sorte a dele. Sorte de Malena.

No entanto, as frenéticas manifestações de cobiça e inveja – respectivamente, empreendidas pelos homens e as mulheres de Castelcuto – sempre andaram lado a lado de Malena. Passando por terríveis provações, Malena amargou incontáveis dores, sem nunca perder a altivez. Talvez por isso, ela tenha recebido a tácita cumplicidade e a compreensão do menino Renato. Isso porque, quis o destino que somente ele estivesse ao lado dela em todos os momentos.

A bicicleta de Renato, em verdade, apontou bem mais do que os novos caminhos que a vida expectava. Montado nela, o garoto acompanhou e viveu o drama de Malena. Extraindo da inocente alma os confusos sentimentos que brotavam. Pior ainda: tendo que dar conta deles em tempo real, pois nada podia ser adiado. E assim, sentado no banco da bicicleta, Renato começou a compreender a vida e a travar com os sentimentos uma peleja que nunca mais findará!

Ao reencontrar Malena, quem sabe despedindo-se da paixão, ele nos deixou um belíssimo legado, narrado agora pelas lembranças de um “envelhecido” Renato: “Eu pedalava como se fugisse. E, na verdade, fugia: dela, daquelas emoções, dos sonhos, das recordações, de tudo enfim… E pensava que precisava esquecer. Eu tinha certeza de que conseguiria esquecer. Mas, agora que estou velho, que consumi banalmente minha vida, que conheci tantas mulheres que me disseram: lembre-se de mim, percebo que esqueci todas. Porém, até hoje, ela é a única mulher que jamais esqueci: Malena”.

 

Malena