UM MUNDO PREOCUPANTE

A sentença quase sempre era a mesma: “você errou aqui e acolá. Um absurdo!” Depois disso, a verdade é que raramente as coisas costumavam tomar outro rumo. Pior ainda: quando mudava, nem sempre era pra melhor. Afinal de contas, ter um dedo em riste apontado em nossa direção, céus, isso é algo constrangedor. Humilhante. Porquanto o gesto intimida qualquer criatura.

O que eu posso dizer é que Gustavo era um sujeito tímido, de poucas palavras. Em pequenos ambientes, ele até conseguia se comunicar com os outros. No entanto, bastava o grupo aumentar em número ou em posturas exibicionistas, aí, minha gente, Gustavo se enterrava no primeiro buraco que via. Feito um avestruz…

Para ele, a primeira solução era se esconder, até porque “quem não é visto, não é lembrado”. E Gustavo se esmerava nesse ditado, convenhamos. Fosse para buscar o ‘lado escuro’ que existe em todo grupo, fosse para sair de fininho, “à francesa”, como diziam os especialistas em comportamento humano.

De um jeito ou de outro, o certo é que os ‘estragos se acumulavam’ sucessivamente. E Gustavo demonstrava sentir os golpes da vida. De tal maneira, que quase não víamos mais ele pelas redondezas do bairro. Preferia viver sozinho, sempre recolhido. E olha que eu era o amigo mais próximo dele . Mesmo assim, eu percebia que ele também me evitava. Ora mudando o lado da calçada, ora descendo as escadas do prédio para evitar encontros indesejáveis.

O diabo é que essas coisas só tendem a aumentar. Lamentavelmente. A partir daí, surgem as críticas e perseguições. Até mesmo acusações infundadas. Se observarmos ao redor, veremos que o número de ‘grupos minoritários’ tem aumentado assustadoramente nos últimos tempos. Quem sabe não seja por conta da intolerância que vemos em tantas criaturas ou seitas? Sim! Nós estamos vivendo tempos difíceis, minha gente. Tempos covardes e até violentos. E isso assusta bastante!

Eu não sei dizer qual foi o destino de Gustavo, pois me mudei de cidade e estado e nunca mais soube dele. Algumas vezes, eu perguntei aos amigos comuns sobre o paradeiro dele. Ninguém soube responder ou sequer teve interesse no destino do nosso amigo. Preocupado, eu torço apenas para que ele não tenha sucumbido ao impiedoso coletivo humano. Esse, ah, nós já conhecemos bem: é costumeiramente cruel e intolerante com qualquer tipo diferente. Aliás, sempre tomam o ‘diferente’ como um suposto oponente…

Publicado por

Carlos Holbein

Professor de química por formação ou "sina" e escritor por "vocação" ou insistência...