Hoje de manhã, ao dar bom-dia para minha mulher, eu percebi que ela estava bastante emocionada. Beijou-me com carinho e perguntou se eu dormi bem. Disse que sim. E ela, então, falou-me do diálogo que teve com o neto, ontem de noite. Segundo ela, ao perguntar ao neto como ele estava, recebeu como resposta que ele estava “muito cansado”. Pronto. Bastou esta frase. A partir daí, desencadeou-se uma rede interminável de pensamentos e emoções dignas de uma avó presente e preocupada.
Depois disso, já no nosso café da manhã, ela pegou o telefone e pôs para tocar uma melodia do Cazuza, intitulada “Poema”. Ouvi a canção na luxuosa voz de Ney Matogrosso e fiquei paralisado. Tomado por um sentimento intenso de amor e carinho, de abandono e luto e, ao mesmo tempo, de luz, muita luz ao meu redor.
É que, no fundo, eu me senti identificado com a letra de Cazuza. Envolvido pelo recorrente sentimento de tristeza por não ter conhecido as minhas avós. Quando muito, um único e indiferente avô, cuja relação não foi capaz de aplacar essa dor. Daí, eu ouvi os primeiros versos:
“Eu hoje tive um pesadelo / E levantei atento, a tempo / Eu acordei com medo / E procurei no escuro / Alguém com o seu carinho / E lembrei de um tempo…”
Foi quando eu me refiz do impacto inicial e argumentei com a minha esposa de que o papel dela na vida do neto é acalentador, pois, desde muito novo, ele declarava a satisfação de vir nos visitar. Na época, lembro bem, ele dizia que adorava visitar a casa da vovó Zê, porque sempre tinha “tomida”. Céus… aquilo era suficiente para arrancar a nossa gargalhada!
Sim, vovó Zê, aqui ele sempre recebeu carinho e aconchego, em todos os momentos. E isso nos enche de prazer e satisfação. Afinal, ao acompanharmos as diferentes fases que ele tem passado, a marca comum desse convívio sempre foi “chamego”. Coisa linda!
“Porque o passado me traz uma lembrança / Do tempo que eu era criança / E o medo era motivo de choro / Desculpa pra um abraço ou um consolo…”
Hoje em dia, aos oito anos de idade, a verdade é que Gabriel, o tio gurú, tem sido a presença mais marcante na trajetória dele. Ainda que vez por outra ele sinta necessidade de se aninhar conosco no sofá e receber o velho e gostoso ‘cafuné’…
No entanto, mais dia, menos dia, haverá o momento em que lembraremos de outro verso dessa canção:
“Hoje eu acordei com medo / Mas não chorei, nem reclamei abrigo / Do escuro, eu via o infinito / Sem presente, passado ou futuro / Senti um abraço forte, já não era medo / Era uma coisa sua que ficou em mim…




