PAULINHO E O DISCO VOADOR

Que a gente escuta muitas histórias no ‘percurso da vida’, lá, isso é sabido. Sabemos também que muitas delas não merecem crédito suficiente. Já algumas outras, convenhamos, merecem até mesmo desconfiança… Fazer o quê?! No fim das contas, tudo isso faz parte da vida e a gente aprende a separar o ‘joio do trigo’, não é assim que dizem?

No entanto, devo reconhecer, houve uma história que até hoje não consegui ‘digerir’ e nem fazer o juízo perfeito. Isso porque, cá entre nós, ela foi contada por um amigo pelo qual tenho profundo respeito e afeição: Paulo Brasil. Olha, minha gente, independente do excelente humor, Paulo é reconhecido por todos como um ‘poço de seriedade’ e passa toda a confiança do mundo para os seus interlocutores.

O fato é que ele possui uma belíssima chácara em Penedo, região da serra carioca, próximo de Itatiaia, que possui um clima espetacular. Isso sem falar da ‘truta’, a iguaria criada em cativeiro nas inúmeras cachoeiras do pequeno município. Eu nem consigo lembrar quantas vezes subi a serra só para degustar uma deliciosa “Truta à Belle Meunière”, acompanhada de camarão miúdo, alcaparras e por champignon fatiado. Céus! Um verdadeiro manjar dos deuses!

Mas eu estava querendo contar uma história do ‘outro mundo’… Calma aí que eu explico.

É que segundo o Paulo Brasil, houve um determinado dia que ele saiu de casa tarde da noite, contornando a Pequena Finlândia, em direção à Avenida das Mangueiras. A ideia era pegar a saída do município de Penedo pela estrada secundária. Contou-me, então, que não havia ninguém na rua, já que passava das três da madrugada. E nem bem ele desembocou na rodovia secundária, começou a vislumbrar um conjunto de luzes, um pouco acima do horizonte. Disse, com convicção, que parou o carro no acostamento e ficou observando as luzes se deslocando para cima e para o lado, indo e voltando. Era uma visão impressionante, afirmou Paulo!

Como já foi fotógrafo profissional, Paulinho costumava andar sempre com sua poderosa máquina no porta-malas do carro. Ao se lembrar disso, foi até lá, pegou a câmera e começou a fotografar tudo. Exultante com o evento, tirou mais de trinta fotos do ‘disco voador’, com direito a “zoom” e o escambau…

Na estrada, ele só pensava no incrível material que havia conseguido registrar. Distraiu-se tanto nos pensamentos que nem percebeu que dirigia acima dos limites estabelecidos e, para seu infortúnio, foi parado pela Polícia Rodoviária Federal.

Sem demonstrar preocupação, ele desceu do carro e apresentou os documentos exigidos pelo guarda. Quando muito, seria apenas uma multa, pensou com seus botões. Foi quando o policial perguntou o que ele estava fazendo àquela hora da madrugada, ainda mais com uma câmera fotográfica pendurada no pescoço?

– Seu guarda, é que eu vinha de Penedo e, de repente, apareceu um disco voador e resolvi fotografar… aí, sabe como é…

Os guardas entreolhavam-se perplexos e Paulinho, orgulhoso, arrematou:

-Tenho tudo aqui registrado na minha câmera. Querem ver?
Pegou a máquina e começou a mostrar. Nada. Apenas um borrão de luz. Aflito, ele disse: “Calma, eu tenho muitas fotos!”

Os policiais, pacientemente, olharam uma por uma e viram somente um conjunto de borrões luminosos. Tanto é que um deles desistiu de olhar e começou a vistoriar o carro do Paulo, encontrando além da mochila com roupas, duas garrafas de gin. Paulo tentou argumentar que as garrafas estavam na chácara há muitos anos e que não bebe nada alcoólico há mais de vinte anos.
Tudo em vão. Como o posto policial não dispunha de bafômetro para fazer o teste, Paulo teve que dormir na Polícia Rodoviária e somente no dia seguinte eles o liberaram. Foram aplicadas quatro multas: excesso de velocidade, embriaguez, falso testemunho e desacato à autoridade!

O TEMPO E A ALMA

Hoje de manhã, ao dar bom-dia para minha mulher, eu percebi que ela estava bastante emocionada. Beijou-me com carinho e perguntou se eu dormi bem. Disse que sim. E ela, então, falou-me do diálogo que teve com o neto, ontem de noite. Segundo ela, ao perguntar ao neto como ele estava, recebeu como resposta que ele estava “muito cansado”. Pronto. Bastou esta frase. A partir daí, desencadeou-se uma rede interminável de pensamentos e emoções dignas de uma avó presente e preocupada.

Depois disso, já no nosso café da manhã, ela pegou o telefone e pôs para tocar uma melodia do Cazuza, intitulada “Poema”. Ouvi a canção na luxuosa voz de Ney Matogrosso e fiquei paralisado. Tomado por um sentimento intenso de amor e carinho, de abandono e luto e, ao mesmo tempo, de luz, muita luz ao meu redor.

É que, no fundo, eu me senti identificado com a letra de Cazuza. Envolvido pelo recorrente sentimento de tristeza por não ter conhecido as minhas avós. Quando muito, um único e indiferente avô, cuja relação não foi capaz de aplacar essa dor. Daí, eu ouvi os primeiros versos:

“Eu hoje tive um pesadelo / E levantei atento, a tempo / Eu acordei com medo / E procurei no escuro / Alguém com o seu carinho / E lembrei de um tempo…”

Foi quando eu me refiz do impacto inicial e argumentei com a minha esposa de que o papel dela na vida do neto é acalentador, pois, desde muito novo, ele declarava a satisfação de vir nos visitar. Na época, lembro bem, ele dizia que adorava visitar a casa da vovó Zê, porque sempre tinha “tomida”. Céus… aquilo era suficiente para arrancar a nossa gargalhada!

Sim, vovó Zê, aqui ele sempre recebeu carinho e aconchego, em todos os momentos. E isso nos enche de prazer e satisfação. Afinal, ao acompanharmos as diferentes fases que ele tem passado, a marca comum desse convívio sempre foi “chamego”. Coisa linda!

“Porque o passado me traz uma lembrança / Do tempo que eu era criança / E o medo era motivo de choro / Desculpa pra um abraço ou um consolo…”

Hoje em dia, aos oito anos de idade, a verdade é que Gabriel, o tio gurú, tem sido a presença mais marcante na trajetória dele. Ainda que vez por outra ele sinta necessidade de se aninhar conosco no sofá e receber o velho e gostoso ‘cafuné’…

No entanto, mais dia, menos dia, haverá o momento em que lembraremos de outro verso dessa canção:

“Hoje eu acordei com medo / Mas não chorei, nem reclamei abrigo / Do escuro, eu via o infinito / Sem presente, passado ou futuro / Senti um abraço forte, já não era medo / Era uma coisa sua que ficou em mim…

UMA VELHA HISTÓRIA

A ordem foi bem clara: aguardar a chegada da Kombi na esquina da Rio Branco com a Presidente Vargas, em frente ao prédio do Banco do Brasil. E mais: impreterivelmente, às 19 horas. A senha para o reconhecimento seria: “ONDE FICA SÃO CRISTÓVÃO?” E a resposta deveria ser: “BASTA SEGUIR EM FRENTE!”

Como Amaral trabalhava ali perto, ele teve tempo de tomar um café com leite e comer um pão com manteiga, pois sabia que a empreitada seria longa. Muita longa. Assim, por precaução, ele comprou um maço de Continental e uma revista de palavras cruzadas. Até porque, nunca se sabe o tempo de espera. Além disso, Amaral conhecia muito bem os ‘ritos’ que o Partido determinava em encontros clandestinos. E esse, convenhamos, não era um encontro qualquer. Ah, não! Por certo, era o encontro mais importante de sua vida!

Às 19 horas, pontualmente, ele ouviu a discreta buzina da Kombi. Logo a seguir, vieram os protocolos de identificação e, ao confirmarem as senhas, ele entrou rapidamente no veículo. Abriu a porta traseira e sentou-se no último banco. Dali, eles pegaram a avenida Presidente Vargas em direção ao Gasômetro, via Francisco Bicalho. Foi quando o motorista avisou que ele devia vendar os olhos, tão logo entrassem na Avenida Brasil.

Dito e feito. Amaral era uma criatura muito disciplinada e seguia todas as regras de segurança. Além do mais, ele sabia que a viagem seria longa e sem conversas. Apenas o rádio da Kombi quebraria o silêncio, transmitindo o hilário programa “BALANÇA MAS NÃO CAI”. O motorista, de codinome ‘Serjão’, era de pouca conversa, embora soltasse discretos sorrisos por conta do programa do rádio.

Foram quase cinco horas de viagem e Amaral percebeu que o motorista deu muitas voltas em estradas esburacadas, o que tornou o trajeto mais cansativo e tenso. Somente por volta da meia-noite eles chegaram ao destino. Desceu da Kombi e, relaxando a musculatura, pode tirar a venda dos olhos. Mas pouco adiantou, pois o pequeno sítio era muito escuro, quase sem lâmpadas. Entrou na casa e recebeu a instrução de que aguardasse a chegada do ‘chefe’. Isso, porém, só ocorreu às duas da madrugada, quando as portas do escritório se abriram e Amaral foi avisado de que deveria entrar no gabinete. Caminhou lentamente, sentindo forte pressão no peito. Mal disfarçava a tremedeira nas pernas…

No entanto, esse intervalo de tempo foi proveitoso, já que permitiu a Amaral o ajuste do raciocínio, Com isso, ele conseguiu pôr em ordem os argumentos que iria abordar. Por ser um homem metódico, Amaral anotava no pequeno caderno de bolso os principais tópicos. “O resto vai ser no improviso!”, pensou aliviado.

O fato é que toda essa espera gerava uma tremenda aflição, justificada, uma vez que a figura de Prestes era idolatrada dentro do Partido. Qualquer um daria tudo para estar frente a frente com o Secretário Geral. E para muitos, isso representava uma condecoração de alto valor: poder, enfim, participar dos ‘rumos’ do Partido.

É bem verdade que ele nunca havia se encontrado com o ‘camarada chefe’. Conhecia a figura apenas pelas fotos dos jornais e pelas informações nos bastidores. Luís Carlos Prestes, ao cumprimentá-lo, parecia não saber sobre o papel que o companheiro desempenhava no Partido. Tanto é que iniciou a conversa indagando sobre as movimentações e manobras na ‘célula’ do sindicato. Amaral, por sua vez, estranhou o equívoco e identificou-se como elemento que atuava no Banco do Brasil, vindo prestar contas sobre os processos de sua ‘célula’. Conforme ia narrando as estratégias que eram usadas, percebia que o ‘chefe’ estava desinformado. Pior ainda: de quando em quando, Prestes perguntava alguma coisa aos seus assessores a respeito do que estava sendo relatado.

Naquele momento, Amaral se lembrou da piada que circulava nos bastidores: “só levam ao conhecimento do ‘chefe’ os assuntos que são do interesse do escalão superior”. Até porque, assessor que se preza, espertamente, fornece apenas as ‘boas notícias’.

Passados cinquenta minutos de conversa, Amaral já se sentia bastante decepcionado com o encontro. Isso porque, ele foi se dando conta de que as ‘velhas leis’ que regem os estatutos do Partido, no fundo, são apenas discursos retóricos. Algo que não funciona mais. Ou, quem sabe, nunca funcionou?! Fazem parte do ‘manual’. Tão somente.

Talvez, por conta disso, Amaral tenha se ‘encorajado’ a cobrar mais transparência do Comitê Central, na figura do Secretário-Geral Luís Carlos Prestes. Foi daí que ele iniciou uma longa exposição de motivos baseados nos mais de vinte anos de militância dentro do Partido. Apontou enganos, salientou desvios, traçou estratégias, enfim, expôs as ‘ideias’ da turma do baixo clero… Ao final da argumentação, ele ouviu do secretário que estava coberto de razões. Que mudanças deveriam ocorrer imediatamente, para o bem da causa e do Partido. Prestes, aproveitou o ‘palanque’ e determinou novas orientações para os assessores que, evidentemente, concordaram em gênero, número e grau com o chefe. Até mesmo o parabenizaram pelas soluções criadas…

Amaral saiu de lá exultante, sentindo-se vitorioso. Ao mesmo tempo, durante o percurso da volta, sentia uma pontada de descrença fustigando os pensamentos. Mesmo assim, tentando se convencer da vitória, pensou: “agora sim, as coisas vão mudar!” Contudo, decorridos seis meses após o encontro, o bravo camarada Amaral percebeu que nada havia mudado e que os equívocos do velho “Partidão” continuavam iguais… ou piores!

Sim. Foi um duro golpe para ele. Principalmente, por entender que os companheiros da turma de baixo acreditavam profundamente nessas mudanças. E ‘esperança’, meus amigos, é algo que não se posterga. Tampouco se negocia.

Foi assim que o companheiro Amaral, descrente e desestimulado, abandonou o Partido. Saiu com a certeza de que até mesmo o secretário-geral tinha se tornado vítima da ‘burocracia interna’. Paciência. Pelo visto, a velha ‘engrenagem’ emperrou! Fazer o quê?!

NOTÍCIAS DA TV

Eu sempre fui fã de biografias e de entrevistas. Talvez, porque ao ler ou escutar algo interessante, vindo de outra pessoa, a gente acaba repercutindo os argumentos para posterior reflexão. Ou então, quem sabe, os nossos ‘filtros’ emocionais estejam mais relaxados e, assim, nos permitem vibrar em outras frequências?! E aí, como saber?

O que vale é que certa vez ao assistir ao programa de entrevistas numa emissora de TV, eu percebi que o sentido da vida (da minha!) fora ali revelado. Então, deixem-me explicar.

A entrevista transcorria em um consagrado programa de televisão e o convidado especial daquela noite era o ator Juca de Oliveira. Pois muito bem. Tudo transcorria de maneira bastante serena e, algumas vezes, até monótona. Porém, em dado momento, Juca foi indagado sobre a ‘técnica’ que utiliza nos palcos para ‘driblar’ as dificuldades cotidianas em favor da personagem. Então, com muita experiência, Juca declarou: “realmente, nós fazemos uso de certos truques quando percebemos que não ‘vestimos’ a personagem por inteiro. Eu, por exemplo, quando me flagro nessa situação, como ato contínuo, sou tomado por um forte desassossego. E por conta disso, eu busco na plateia, desesperadamente, um rosto que me seja profundamente ‘terno e familiar’. Geralmente, eu acabo encontrando este rosto numa ‘velhinha de cabelos brancos’, sentada logo nas primeiras filas. Por conseguinte, eu começo a desempenhar os primeiros dez ou quinze minutos da peça com o olhar voltado apenas para ‘ela’…

Invariavelmente, o que tem ocorrido é que ‘elas’ percebem e, desse modo, acabam me devolvendo sob a forma de um intenso brilho nos olhos ou um doce sorriso estampado no rosto toda a emoção vivida. Coisa linda! Como consequência, eu fico tão comovido com a reação delas que, quando me dou conta, já incorporei ‘a personagem’. E o restante da peça é, enfim, ofertado a todos”.

Moral da história: de alguma maneira, nós precisamos encontrar em tudo o que fazemos ‘aquela’ velhinha de cabelos brancos. Quem sabe, assim, ao recebermos o brilho intenso, nós também possamos dar mais sentido à vida?! Se possível, de modo irrefreável…

Pode ser uma ilustração

O ‘PRESENTE’ DOS DEUSES

Foi em 2002 que eu conheci Zelândia. Na época, ela estava com o filho pequeno ao seu lado esperando a Van que transportaria a sua criança para a escola. Por sinal, esse ritual se repetia durante toda semana, de segunda a sexta-feira. E eu a observava, sentado no Café do Shopping Lagoa. Era uma linda e arrebatadora visão.

É bem verdade que em meus pensamentos eu me imaginava casado com ela. Afinal, ela era uma linda morena de sorriso tímido. E me remetia às lembranças de “Gabriela, Cravo e Canela”, do querido Jorge Amado. Sim! Nos meus sonhos e fantasias, ah, eu já namorava aquela morena. E talvez, embalado pela lembrança do livro, eu não me sentia mais cearense e sim um árabe, feito o seu Nacib!

Dizem que o universo é mais ligeiro que os nossos sonhos. Isso é bem verdade, pois nem bem passou um ano e eu já estava namorando com ela. Passeávamos a valer pela Lagoa da Conceição e o distante bairro rural do São João do Rio Vermelho, testemunharam o surgimento de um grande amor. Desses, cujos deuses sentem orgulho em patrocinar…

Não demorou muito para juntarmos as tralhas e vivermos juntos. Inicialmente na casa dela, e logo a seguir, construímos a nossa sonhada casa. Antes mesmo da casa ficar pronta, os deuses nos trouxeram uma fantástica surpresa: a vinda de Gabriel, nosso filho.

Ele completa hoje os primeiros vinte e dois anos de vida. E estamos muitos felizes com o desenvolvimento dele, pois possui atributos bem interessantes em sua personalidade.

Parabéns, Gabriel. Que as bênçãos dos deuses acompanhem a sua vida e abram os seus caminhos. Sua mãe, seu irmão e eu estaremos na torcida. Sempre!

“A DOR DE NEM PODER CHORAR

Já fazia um bom tempo que eu não tinha notícias dele. Talvez, uns dez anos ou mais. De todo modo, certo mesmo é que o tempo das emoções é bem diferente do tempo real. E quando se trata de dor, então, céus, é imensurável. Eu vou explicar.

Roberto foi meu colega na faculdade de química, lá pelos anos 1973 a 1976. Era um sujeito inteligente, que aprendia os princípios da química muito mais rápido que todos nós. E aquilo me impressionava bastante, confesso: a sagacidade que ele tinha no trato das ciências exatas. No entanto, ao contrário disso, nas questões afetivas e emocionais, ah, ele era um zero à esquerda. É que nesse campo, por infortúnio, ele mal conseguia ‘soletrar a vida’. Pode-se dizer que as relações afetivas eram o seu ‘Calcanhar de Aquiles’. Afinal, ele vivia sempre enrolado. Sempre confuso. E em permanente crise. O que eu sei é que as suas escolhas eram equivocadas, impulsionadas por ímpetos autodestrutivos. Uma verdadeira lástima, meus amigos…

A vida, então, seguiu o rumo que pode e apresentou para cada um de nós alguns desafios. Para a maioria das pessoas, por certo, isso é normal e não constituía problema maior. Ainda que algumas vezes tropeçássemos aqui ou acolá. O fato é que logo a seguir percebíamos as dificuldades e aprendemos a dar as respostas adequadas. Pudera! Essa foi a grande peleja que travamos com a vida. Apesar das dificuldades, tudo indica que a gente aprendeu a decifrar os enigmas. E isso foi reconfortante. Encorajador!

Contudo, para um pequeno grupo de criaturas, meu Deus do Céu, essas questões se transformam em processos penosos. Foi o que eu percebi hoje, ao me encontrar casualmente com o Roberto. Aliás, no primeiro momento, nós festejamos o encontro. Perguntamos sobre a vida do outro, essas coisas que o destino apronta. Foi quando eu ouvi o angustiante relato dele. Falou-me com tristeza dos incontáveis ‘desencontros’ que teve na vida. O casamento e a separação. O emprego e a crise financeira. Os filhos e as doenças que nunca lhe deram trégua. Por algum motivo escondido nas minhas emoções, ah, eu me lembrei da melodia de Raimundo Sodré, “A Massa”:

“A dor da gente é dor de menino acanhado /
Menino-bezerro pisado no curral do mundo a penar /
Que salta aos olhos igual a um gemido calado /
A sombra do mal-assombrado é a dor de nem poder chorar.”

Sim! o mais difícil é perceber que a vida tem lá as suas manhas e seu jeito de encaixar. E se a gente demora a empreender isso, caramba… é uma encrenca só. O diabo é que a vida não fornece ‘salvo-conduto’ a ninguém. Ou a gente pega no ‘tranco’ ou, então, vai pagar o pedágio por muito tempo a fora. Paciência. Quem sabe não seja essa a mais difícil ‘seleção natural’?

Se for verdade, vixe, o jeito é aprender rapidinho o ‘dever de casa’. Para que o imposto cobrado não sangre demais as emoções da gente. Na dúvida, é bom lembrar os versos sofridos de Raimundo Sodré:

“A dor da gente é dor de menino acanhado /
Menino-bezerro pisado no curral do mundo a penar /
Que salta aos olhos igual a um gemido calado /
A sombra do mal-assombrado é a dor de nem poder chorar.”