“MENOR QUE O MEU SONHO NÃO POSSO SER…” (Lindolfo Bell, poeta)

Verdade é que esse tema não é novo. E, por certo, não resume a vida em uma frase. Mas, cá entre nós: que ele abre uma imensa janela para incontáveis digressões, lá, isso sim!

É que falar sobre ‘sonho’ parece ser algo sedutor ou, pelo menos, algo que alimenta a nossa fantasia e, por tabela, a nossa carência por ‘boas notícias’. Pudera! Os tempos andam demasiadamente bicudos e as más notícias chegam mais rápido que sinal de “wifi”. Como consequência, muitas vezes elas conseguem nos deixar acuados. Ou impotentes diante das ‘veladas’ ameaças que podem incorporar. Mas, calma, aí… Eu explico!

Quando eu era menino, por volta dos doze anos de idade, havia um grupo inseparável de amigos, moradores do Edifício Esperanto, lá na velha Zamenhof. E como todo grupo que se preza, nós tínhamos inúmeros desafios a cumprir. Todos os dias, minha gente! Um dia era roubar frutas na chácara da Quintino do Vale, já no outro, íamos pegar carona de bonde e apostar quem conseguia pular de costas. E, por aí, os desafios se sucediam.

Até que certo dia, Ênio desceu com um cartaz que havia desenvolvido secretamente. Reuniu o grupo na garagem do prédio e, sentado sobre a caixa d’água, começou a explicar o ‘intricado plano’. Era um desenho estranho, com o título escrito na parte de baixo, escrito com letras garrafais: “PROJETO DE ARMADILHA DE DISCO VOADOR”. Céus! Eu fiquei de boca aberta com tanta astúcia e criatividade. Por isso, fui o primeiro a indagar: “Mas, onde é que tem disco voador aqui no Estácio, Ênio?!”

A verdade é que Ênio sempre foi um sujeito calmo e paciente. Mas, naquele dia, em especial, alguma coisa ferveu dentro dele com a minha pergunta. Principalmente porque logo a seguir, o Isac emendou: “Se tiver que pagar alguma coisa, eu estou fora!”

Ênio respirou fundo e pausadamente respondeu: “Isac, você sabe a origem do seu nome? Sabia que Isaac tem como origem os nomes hebraicos “Itshak e Yitzháq”, os quais derivam da palavra “tzaháq”, que literalmente quer dizer “ele irá rir”. Por extensão, o seu nome tem o sentido de “filho da alegria”… Então, faça-me um favor: honre o seu nome e não fale mais nenhuma asneira, combinado, parceiro?!”

Caramba! Aquilo me deixou orgulhoso. Que capacidade tinha o Ênio nas argumentações… Brilhante, isso sim! Mas, o fato é que a grande dúvida permanecia sem resposta: onde colocar a armadilha para pegar disco voador?

Ênio sugeriu que por conta da abundância de frutas (vai que um ET está com fome), o melhor lugar seria na chácara de Quintino do Vale. Afinal, à noite a chácara fica deserta e pode atrair algum disco sem levantar suspeita…

Então, munidos de toda parafernália que Ênio havia sugerido levar, lá estávamos nós no cair da noite preparando a bendita “armadilha”. Marteladas aqui, amarrações acolá e, no fim das contas, havíamos preparado a famigerada engenhoca, batizada por nós de “TRAPIZONGA Nº 1”.

O plano, engenhosamente arquitetado, incluía nós dormirmos na chácara. No entanto, não houve consenso, uma vez que alguns colegas do grupo alegaram impedimentos de várias ordens. Para alguns, os pais não permitiam. Outros disseram que tinham escola bem cedo e deviam tomar banho e arrumar o material escolar. Porém, o quarteto solidário permaneceu fiel ao ‘desafio’. Eu era um deles!

Então, pouco depois das onze da noite tudo já estava preparado e montado. Conversamos por mais uma hora, porém o sono nos rendeu por completo. Como havíamos levado barracas, cada um procurou se aninhar como pode naquele terreno irregular da chácara.

Até que em um determinado momento da madrugada, meus amigos, nós acordamos com uma forte luz branca piscando em nossas barracas. Confesso que fiquei com medo e vacilei um bocado se devia abrir ou não o zíper da barraca. Ao mesmo tempo, havia um intenso barulho de motor ao redor. O que poderia ser?!

Com muito custo, eu acabei rendido pela curiosidade e abri o zíper. Contudo, não conseguia ver nada, porquanto a luz era forte demais, e nos cegava por completo. Passados alguns instantes, eu consegui ouvir a voz do Ênio, em meio aos gritos. Ele dizia para alguém que aquilo tudo era apenas uma ‘experiência científica’. Que não prejudicava ninguém… Qual o quê! O outro lado, meus amigos, respondia apenas que nós tínhamos dez minutos para desarmar a “TRAPIZONGA” e sem fazer barulho. Caso contrário, iríamos todos para FUNABEM passar longas férias e conversar com os ‘extraterrestres’ que têm lá.

Ufa… Tremendo sufoco, isso sim!