A SOMBRA E A ESCURIDÃO

Lá se vão vinte anos que eu publiquei um texto intitulado “Verdades e Mentiras”. Ele foi escrito para a revista “Clube do Áudio & Vídeo”, de São Paulo. Poucos meses depois, o texto também foi publicado na revista “AUDIO – CINEMA EM CASA”, em Portugal . O artigo fazia parte da coluna sobre cinema que eu assinava, em ambas revistas, e foi inspirado a partir do belo filme “A sombra e a escuridão”, do diretor Stephen Hopkins.

Esse texto tinha como pano de fundo a história do filme e fazia alusões aos conflitos oriundos dos antagonismos da vida. Ou seja, as velhas contradições entre o bem e o mal, o novo e o velho, enfim, as verdades e as mentiras presentes no decorrer da vida.

De imediato, eu devo reconhecer que aquele texto foi algo muito emocional, uma vez que eu procurei dividir com o leitor as dúvidas que me afligiam na época. Ironicamente, de algum modo, muitas delas ainda permanecem e se tornaram perenes em nosso percurso.

Lembro até que em dado momento do artigo, eu externei: “No curso da vida, pode-se observar que muitas pessoas optam pelo silêncio. Outras tantas, preferem acolher o cinismo. Mas a grande maioria, por certo, fica por conta da ignorância. Lamentavelmente. São criaturas que jamais vasculharão a ‘caixa-preta’ em busca das verdades… Agora, devo confessar: eu não sei o que é melhor. Tampouco estou aqui a fazer julgamento de valor. No fundo, são questões muito individuais e que só a criatura envolvida pode responder, isso sim! Se eu trago estas reflexões à baila, creiam-me, é tão somente porque elas estão a vazar do copo e encontro em cada um de vocês a solidariedade tácita. Afinal, todos nós somos vítimas de diferentes ‘verdades e mentiras’, não acham?!”

Pois é, meus amigos. O fato é que, de lá para cá, o mundo girou mais um bocado. Muitas histórias transcorreram. E, com isso, a gente acaba acreditando que aquelas aflições prescreveram e que o ‘mundo’ agora é outro!

De certo modo, ele é verdadeiramente outro. E será necessário aceitar essa ‘sentença’. Afinal, o nosso mundo ficou de pernas para o ar, após essa pandemia. São incontáveis as mudanças de conceitos que tiveram profundas alterações. E muitas outras irão surgir no bojo dessa famigerada crise. Atitudes foram necessárias. Gestos e expressões adquiriram novos encaminhamentos. Até quando? Não se sabe! Quais os resultados disso? Ainda é muito cedo para termos respostas… De certo, mesmo, é que os prejuízos são imensos, não apenas materiais. Bem pior serão as sequelas deixadas pela falta de aulas, pelo desemprego maciço ou pela insegurança do que está para vir!

Seguramente, eu sempre tive uma postura otimista diante da vida e das perspectivas do mundo. No entanto, não consigo esconder a minha preocupação. Porquanto desconfio que precisaremos bem mais do que otimismo para encararmos os desafios futuros. Serão necessárias a resiliência, a disciplina, a solidariedade e outras coisas mais para enfrentarmos a ‘nova realidade’.

Até porque, minha gente, nem sempre a lembrança do diálogo travado entre o caçador e o amigo ocorrido no filme “A sombra e a escuridão” será suficiente para a memória coletiva:

“Quando eu era menino, havia um brutamonte na cidade. Aterrorizava todo mundo. Mas ele, não era nada. Tinha um irmão pior ainda. Mas, também não era nada. O problema era quando estavam juntos. Sozinhos, eram só brutamontes. Juntos, eram mortíferos. O amigo, então, indaga: O que aconteceu com eles? E o caçador, soberbamente, responde: Bem… eu cresci!”