Tem gente que é sortuda nessa vida. Meu Deus do Céu, os homens conseguem toda sorte de proezas, aqui e acolá. Já o Marquinhos não! Ele sempre foi ‘perseguido’ pelo azar. Muito embora procurasse não reclamar, talvez, como forma de não chamar a atenção da ‘urucubaca’ que colara nele desde criança. É o tal negócio: se havia alguma chance de algo dar errado, por certo, ocorreria com o Marquinhos. Eta ‘pé-frio’ danado!
Lembro que um dia, quando ainda éramos adolescentes de quinze anos, Luiz Henrique, Marquinhos e eu planejamos dar ‘um beiço’ no Divino Bar. Ficava ali no início da Haddock Lobo, perto da Rua do Matoso, na Tijuca, bem ao lado do Cinema Madrid. O plano era cada um escolher um sorvete da primeira linha. Podia ser “sundae”, “banana split” ou mesmo a taça imperial, que continha sorvete de creme, morango e chocolate. Tudo isso, é claro, regado com chantili e castanhas de caju. Um verdadeiro banquete de sobremesas.
Como parte do planejamento, a gente procurou se sentar na mesa mais externa que havia, já pensando na fuga. E aí, então, nós fizemos o pedido para o garçom. Contudo, parece até que as nossas risadas nervosas ‘denunciaram’ a intenção do golpe. Uma vez que, logo a seguir, o garçom trouxe os sorvetes e não saiu mais do nosso lado. Plantou feito uma árvore, observando cada gesto nosso. Impávido!
Foi quando eu pedi licença ao grupo e avisei que iria ao banheiro. E fui. Mas na volta, passando por trás do garçom, saí sem chamar a atenção. Atravessei a rua e fiquei observando tudo de longe. Luiz Henrique, por sua vez, ao perceber que eu estava demorando, levantou-se e falou em voz alta para que o garçom pudesse ouvir: “vou ver se o Chau está passando mal no banheiro, uma vez que está demorando!” Saiu da mesa e usou a mesma estratégia que eu: quando retornou, deu a volta no salão e tomou o rumo da rua numa fuga silenciosa…
Conclusão: só restou o Marquinhos naquela mesa e o garçom prevendo o golpe, colou no único remanescente, sem dar trégua. Nesse momento, em pânico, Marquinhos tentou a última cartada: pediu a conta. Sua esperança era de que o garçom, ao sair para ir ao Caixa pedir a nota, pudesse dar a oportunidade para ele correr feito um louco.
Mas, como eu disse acima, o diabo é que o Marquinhos não havia feito pacto com a sorte. E para seu infortúnio, meus amigos, o garçom foi mais esperto e pediu a outro colega que trouxesse a conta daquela mesa. Com isso, ele ficou aguardando bem pertinho do pobre coitado do Marquinhos. Já viram, né? A conta veio e, como não havia outro jeito, Marquinhos puxou as únicas cédulas que tinha no bolso. No entanto, elas só quitavam o sorvete dele, não resolvendo a grande ‘questão’. Ele ainda tentou argumentar que estaria pagando a parte que consumiu e, portanto, não podia se responsabilizar pelos outros. Mas, o fato é que o gerente foi convocado e avisou que iria chamar a polícia…
O que sei dizer é que o ‘azarado’ do Marquinhos teve que ficar lavando as louças do restaurante até o fim do expediente, lá pelas duas da madrugada. Pois é: ‘deu ruim’ para ele. Fazer o quê?!
Nota: o bom e velho “Divino Bar’ (toldo vermelho) não existe mais… Como tantos outros, ele sucumbiu juntamente com o sofrido Rio de Janeiro.
