Entrar naquele recinto até que era bem fácil. Fácil mesmo. E chegando lá dentro, é verdade, havia um mundaréu de escolhas para fazer. Escolhas que dependiam do tamanho, por certo, uma vez que não se podia chamar a ‘atenção’ dos outros. Principalmente do guarda que ficava na entrada da loja.No entanto, devo reconhecer que por ser ‘calouro’, evidentemente, eu não possuía a manha adequada e nem a prática desse exercício. Afinal, segundo os mais velhos, “essa malandragem só se pega com o tempo!” Pois é… Tempo era o que eu mais tinha pela frente, meus amigos. Isto porque, convenhamos, sendo criança, todas as tardes da minha vida estavam disponíveis…Naquela tarde, em especial, eu havia programado assistir a sessão das quatro do Metro-Tijuca, com o Festival “Johnny Weissmuller”, interpretando o grande Tarzan. Céus, eu estava em êxtase, só imaginando aqueles gritos ecoando na sala: “ôôuuôôôôuuôôêêê!Empurrado pelos pensamentos, aprontei-me rapidamente e peguei o bonde que ia até a Muda da Tijuca. Esse bonde passava pela Praça Saens Peña que, na época, era a nossa “Broadway” tupiniquim. O fato é que nós tínhamos muito orgulho disso. Aliás, se não estou enganado, só ao redor da praça tinham mais de dez cinemas e outros dois ou três em ruas próximas. Havia filme para todo gosto. Lá, isso sim!Mas… Como eu ia dizendo, naquela tarde eu, Luiz Henrique e Edinho fomos para a praça com a intenção de receber aquela ‘adrenalina’ do Tarzan. Antes, porém, passamos nas “Lojas Americanas” para comprar guloseimas. Na verdade, era o Edinho que iria comprar, pois não lhe faltava dinheiro para isso. Luiz Henrique, como era comedido, sempre juntava ‘algum’. E eu, cá entre nós, andava mais ‘liso’ que retirante cearense. Paciência!Então, escolhemos as guloseimas e fomos em direção ao caixa. Luiz Henrique colocou o chocolate e a caixa de Mentex na esteira e pagou. Edinho, mais abastado, comprou chocolate, balas de goma e roscas de polvilho. E eu passei batido, alegando que não comprara nada. A moça do caixa disse ‘tudo bem’. Foi quando nos dirigíamos para a porta principal e o guarda me chamou: ‘ei, moleque, espere aí!”Eu fiz ‘cara de paisagem’ e continuei andando. No entanto, nem dei dois passos e senti aquela mão forte me segurando pelo punho. Puxou-me com força para o canto e disse: “não vai pagar pelo drops?!” Não deu nem tempo para eu responder e ele botou a mão no meu bolso e retirou o Dulcora de hortelã que havia. Minha gente, eu fiquei profundamente encabulado. Mais ainda quando o Edinho disse ao guarda que ele havia me dado de presente e que esquecera de acrescentar quando passou pelo caixa. Daí, tirou uma nota de cinco cruzeiros do bolso e entregou ao guarda para que ele pagasse no caixa, ao mesmo tempo em que se desculpava pelo esquecimento…Seguramente, essa foi a maior ‘lição’ que eu tive na infância. Confesso que nunca mais me senti tentado a pegar o que não me pertencia. Grande Edinho… Até hoje eu não havia agradecido a ele pelo gesto e, sobretudo, pela lição de vida!!
